Felipe Lwe

"Quem tivé de sapato num sobra, num pode sobrá"


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Filme: “Killer Joe” de William Friedkin (Matador de aluguel) 2011


Ontem assisti “Killer Joe”, havia visto um tempo atrás que a “Teorema”, revista de crítica cinematográfica, trazia uma crítica sobre o filme e antes de lê-la resolvi assistir e tecer minhas impressões. Do diretor, William Friedkin, eu não conheço nenhuma de suas obras, nem “Exorcista” eu assisti, os últimos filmes dirigidos por ele foram “The Haunted” e “Bug”, ação e terror respectivamente. E “Killer Joe” faz parte do primeiro gênero, apesar de trazer algumas doses de suspense.

A história gira em torno de um assassinato pago que Joe vai fazer a pedido dos integrantes de uma família bastante desestruturada, que vê no seguro da ex-mulher uma possibilidade de sair da miséria e quitar uma dívida que o filho tem com um traficante da região. Mais interessante do que acompanhar a história é acompanhar o personagem central. Matthew McConaughey como Joe consegue uma atmosfera dura, sensual, firme, cínica, demonstrando não ser homem de conversa. Mas a mesma dureza que assume com todos a sua volta ele não assume para si mesmo, para o tesão que sente ao conhecer Dottie, filha mais nova da família, talvez até paixão, uma vez que sua reação no fim do filme demosntra certo ar de carinho e vislumbramento. A todo momento temos certeza de que Joe está no comando da situação, mas ao fim da trama ele descobre em Rex (personagem que aparece apenas nos discursos dos personagens), amante de Sharla Smith nova esposa da família em questão (Gina Gershon), uma mente habilidosa que se utiliza da ingenuidade e confiança de praticamente todos os membros da família para incitar o assassinato dessa ex-mulher, que ele também estava namorando e que acaba por deixar todo o valor do seguro de vida pra ele. Mas Joe descobre toda a trama antes de Rex fugir.

Joe tem uma maneira bastante tranquila e perversa de destruir seus desafetos. Numa das últimas cenas ele humilha Sharla fazendo a chupar uma cocha de frango imitando seu pau, com o rosto já todo marcado pelos golpes físicos que ele havia dado nela alguns momentos antes. Isso porque ele consegue fotos de Sharla chupando Rex. Mas também usa esses macetes psicológicos para atrair a confiança de Dottie e seduzi-la, evocando uma memória infantil de um tipo próximo de prazer sensual que ela talvez já tenha sentido, fazendo-a se sentir segura.

Antes de ser concluído o assassinato, Joe e o Chris se encontram no que parece um parque de diversões abandonado no estado do Texas. Chris pergunta: “Que tipo de progresso estamos tendo?”. Automaticamente me parece que não se fala mais apenas sobre o progresso do assassinato, mas também sobre esse progresso que deixa construções gigantes para trás, sem serventia, com um investimento muito alto e que acabam por servir apenas para um curto período de tempo, para lucros apenas de poucas pessoas ao custo do trabalho e envolvimento de uma comunidade maior. Em outro momento, na retirada do valor da apólice, o pai da família encasqueta com uma linha solta em seu paletó, Sharla se irrita e arranca o fio que acaba por soltar toda a manga do paletó, alardeando a falsidade de toda a situação, tanto do paletó que este homem nunca deve ter vestido um terno na vida, como da situação do seguro que nada mais foi do que um crime premeditado escondido num falso acidente mortal.

É um filme estilístico, assim que começa já se percebe seus “desenhos”. A fotografia é fortemente desenhada, a cada cena parece que descobrimos quais eram as intenções de cada desenho de luz, o que se queria mostrar, quais personagens estariam em evidência, o clima da cena, não chega a ser artificial, no entanto acaba chamando atenção para si enquanto elemento de composição do filme. Há certo interesse em aproximar o filme do gênero faroeste, as cenas externas durante o dia tem uma luz dura, marcada, as cores das locações e/ou do tratamento de pós-produção puxam para os tons amarelos, ocre e alguns vermelhos. E o personagem principal, detetive da polícia local do Texas, traja o figurino perfeito: botas, calças jeans escuras, cinto, arma, camisa e um grande chapéu, além de seus acessórios como policial. Sua apresentação é feita de maneira esquemática a la faroeste: nos primeiros takes vemos apenas partes de seu corpo: os pés saindo do automóvel, as luvas ao volante, o desligar da chave do carro, o chapéu no banco, o esconder a arma com o paletó, o colocar o chapéu, numa sequência rápida de planos sucessivos com um rápido zoom quase que como pra tirar um pouco a respiração, como se algo fosse acontecer mas é apenas o ritual desse homem, de cara muito metódico, o qual não podemos ver o rosto de maneira clara. O cão de guarda da casa em que o detetive acaba de chegar é um personagem bastante irritante, late muito para todos os personagens que entram na casa, menos para o detetive, nem chuva cai enquanto Joe, esse é o nome do detetive, aparece, parecendo perceber o perigo que corre se latir para o homem errado.

Todos os personagens acabam por parecer ‘coxinha’, sabe? Tipo a coxinha de frango da cena final. Todos se acreditam muito inteligentes, mas nenhum consegue o que realmente estava buscando.


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Filme: “Os famosos e os duendes da morte” de Esmir Filho


Acabo de assistir ao filme “Os Famosos e os Duendes da Morte” do Esmir Filho. Assista o filme inteiro aqui! Demorei um tempo pra assisti-lo, fiquei com muita vontade quando ele saiu, mas acabou que eu não vi e vi hoje. O filme é de 2009 e conta a história de um garoto, fã de Bob Dylan, que vive numa cidade do interior na região sul do Brasil. Ele mantém um blog com alguns textos poéticos e na internet assiste alguns vídeos de uma mulher e um homem, são imagens esparsas, sem nenhum sentido fechado, talvez até sem propósito, a não ser aquele de partilhar da sensação que estão experimentando. Quais podem ser as inquietações desse jovem, principalmente com a chegada na cidade do namorado dessa mulher?

Os Famosos e os duendes da morte – Momento em que ficção e realidade são inseparáveis.

A história não se entrega a nós logo de início, os vídeos-poesia se misturam às cenas da realidade, junto a isso os personagens vão chegando e devagar ficamos sabendo quem é quem. O personagem de Henrique Larré, o protagonista, vive com a mãe, o pai faleceu há algum tempo e os avós moram perto na mesma cidade. Seu melhor amigo, o personagem de Samuel Reginatto, está sempre por perto fumando unzinho com ele, a irmã é a moça dos vídeos-poesia, saberemos mais tarde (pelo menos eu entendi isso) que ela junto de seu namorado Julian jogaram-se da principal ponte da cidade num rio, no entanto apenas o namorado sobreviveu e se afastou da cidade devido ao alvoroço que esse acontecimento deve ter causado na época. Todos na cidade, tirando os avós que mantém o hábito de falar em sua língua de origem, um provável alemão, mantém uma certa depressividade no ar, na cidade não há muito a se fazer, praticamente todos se conhecem. O tédio e o ócio fazem parte das casas como uma mobília antiga escondida, sente-se a presença porém não se vê. O rapaz que se jogou da ponte volta para a cidade, vive um tanto isolado, ele representa de certa forma a morte viva, estampada, o desgosto pela vida andando por aí, tamanho desgosto que teria influenciado a garota a pular também. A presença desse rapaz mexe com o personagem de Henrique, sua mãe insiste que ele precisa visistar o túmulo do pai, ele cada vez mais se envolve com os vídeos da garota e seu namorado. Depois de girar, se isolar, ele decide estabelecer contato com o ex-namorado da garota, que está sempre por perto. Tomam um tanto de felicidade, uma bebida bastante amarga que traz no carro e que por sinal versa sobre o fato da felicidade sempre vir acompanhada do amargo, como nada é pra sempre experimentar a felicidade é também experimentar o amargo, eles rumam sem direção com o fusca do rapaz. Entre eles há uma sintonia, de alguma maneira a Garota é o ar que entra pelos pulmões dos dois, é o respiro deles através das imagens dos vídeos postados na internet. Ao chegarem numa rede de distribuição de energia elétrica eles se olham e a garota está entre eles, são os duendes da morte que transformam esses sofrimentos em poesia e dependendo da intensidade com que nos deixamos levar a dor da angústia pode cessar para sempre.

Os Famosos e os duendes da morte - Formalismo no enquadramento.

Formalismo no enquadramento.

Os Famosos e os duendes da morte - Detalhe de Cena

Os Famosos e os duendes da morte – Detalhe de Cena – Fotografia bem planejada

Dentro da obra as cenas de realidade são bastante formais, enquadramentos precisos, a fotografia é milimétrica, estéticamente é um deleite assistir o filme. As cenas de ficção são o oposto, os enquadramentos incertos, a câmera na mão contribui ainda mais com a imprecisão, há sempre uma névoa envolvendo os personagens e as cores puxam bastante para os tons daquele papel furta-cor, rosas e verdes. Talvez a comunicação entre a ficção e a realidade dentro da obra esteja nessa névoa que está presente em termos estéticos na ficção e presente em termos psicológicos na realidade. O ponto alto desse embate acontece na rede de distribuição de energia onde estamos vendo a “realidade” e de repente a estética muda e fica com cara de ficção, dos vídeos-poesia, e agora o que estaria de fato acontecendo? É um momento que não sabemos o que aconteceu de fato, mas aquilo que aconteceu sensorialmente aos dois rapazes. Por não conhecer muito o trabalho de Esmir Filho não posso comparar a nada, no entanto achei bastante madura a direção do filme, o modo como tratar o assunto, nem muito pesado nem muito leve, na medida, como quando nos bate a pergunta “O que que eu to fazendo nesse mundo?”. Os personagens bastante humanos e com várias facetas, é muito gostosa a cena em que o garoto está com a mãe, já bêbada, e se atrapalha com o vinho e os dois riem, a magia acontece naquele momento, como se vissemos algo deles de verdade.

Os Famosos e os duendes da morte - Mãe e filho em manifestação afetiva.

Os Famosos e os duendes da morte – Mãe e filho em manifestação afetiva.

Gosto da trilha sonora, mas acho um tanto repetitiva. Mas ainda não analisei com pormenores o som como um todo no filme. O site do filme ainda está no ar aqui. Tem até um tumblr bem bacana com postagens do filme aqui. Se você gostou da trilha sonora é possível fazer o download de algumas músicas do trilhista Nelo Johann (porém a qualidade de áudio do download nesse link não é muito boa) e agora estou curioso para ler o livro. Quem já leu gostou? Comenta aí embaixo!


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Roubaram o branco do mundo


Acabei de sair da peça de teatro “Roubaram o branco do mundo” que aconteceu aqui no Sesc São Carlos nesse sábado (18/09/10) às 16h. O teatro estava cheio de crianças, com a minha idade só eu, sentado numa das poltronas bem no meio da platéia. O ingresso custou apenas R$2,00 e o espetáculo foi apresentado pela Companhia Teatral Burucutu. Eu gostei do espetáculo, mas acredito que poderia ter sido melhor.

A peça conta a história de Constância, menina que quando nasceu afugentou o branco do mundo, Joaquim, vendedor ambulante de balões, Butano outro vendedor de balões mais jovem e sua amiga.  Os quatro acabam por procurar o branco no mundo e no meio de suas aventuras percebem que o branco está em tudo e em todos nós. Pelo nome da peça eu achei que fosse algo mais misterioso, mas a premissa é bastante interessante.

O cenário é muito bonito, no palco uma moldura com uma pano colorido ao fundo (simulando uma espécie de cochia), um vestido colocado num manequim, um rádio antigo, uma mala pequena, uma mala grande e um quadro (moldura com uma cortina de retalhos) na frente de tudo, que funcionou na mairia das vezes como a janela da casa onde se passa a história. Todo o cenário foi inspirado na cultura popular brasileira do nordeste, os figurinos com várias sobreposições de panos lisos em tons marrons, beges e alguns tons mais escuros próximos do azul marinho e do verde escuro. Todos os objetos de cena estão cuidadosamente preparados para a cena, a carroça com cortinas de chita (muito bem montada que possibilitou uma mise-en-scene cheia de movimentos), o diário de constância, a foto do Joaquim, enfim os objetos foram bem construídos e bem utilizados durante a peça.

A modulação vocal dos atores era um tanto batida, acho que na parte das vozes o espetáculo poderia melhorar, até para a parte (que eu achei muito legal) do teatro de bexigas, pra mim parecia que só se tentou chegar perto do sotaque nordestino, ao invés disso poderia se ter procurado algo de bastante específico em cada personagem para ficar mais interessante e contar mais a respeito do personagem através das vozes. Um dos atores, que personificou o Joaquim, tocou sanfona durante o espetáculo inteiro, o que foi sensacional, a música contribui bastante com a peça, nos leva mais facilmente até o ambiente que eles vivem (eu não sei bem porque mas me lembrei bastante do Beirut) e emociona em alguns momentos mais trsites da peça.

A luz foi mal utilizada, durante todo o tempo que estive dentro do teatro não houve mudança significativa na iluminação, a não ser quando as luzes da platéia se acendiam para que os atores pudessem conversar com a platéia. (Aliás um dos momentos mais interessantes da peça foi quando uma das atrizes entrega uma latinha de ervilhas para a platéia e o outro ator vai procurar, as criaças adoraram e participaram intensamente, a atriz até brinca que, como o personagem principal, o povo se apropriou da latinha, foi bem engraçado) Já que a história se passa numa cidade onde está tudo escuro a luz podia tentar recriar esse espaço de maneira mais efetiva sem ser cansativo para as crianças.

O fato dos atores estarem com microfone prejudicou um pouco a minha percepção sobre a atuação de cada um, o microfone artificializa a voz e me faz distanciar deles. Senti que os atores estavam um pouco nervosos no início, e houve alguns problemas de encenação, a foto do Joaquim sumiu, algumas falas eram sobrepostas e alguns momentos o público se dispersava.

Mas houveram momentos muito bonitos dentro da peça, o final por exemplo é um momento muito bonito. Adorei a utilização da plaquinha FIM. Durante toda a peça houve alguns elementos interessantes com os quais a companhia trabalhou, entre eles o fato dos atores interpretarem narradoes e personagens, havia elipses de tempo (passado – futuro) bem utilizadas, o teatro de bexigas… Enfim no todo eu gostei, acho que com mais tempo de estudo a peça ficaria ainda melhor!

Lendo o site da companhia me parece que o espetáculo que veio para São Carlos conta com algumas modificações, talvez um espetáculo menor do que o original e com outros atores, mas não sei dizer ao certo.Se alguém tiver essa informação por favor deixe nos comentários.